Ir. BEATRIZ GALÁN DOMINGO
Semente de mostarda

No Sri Lanca, as Missionárias Combonianas procuram testemunhar o Evangelho da vida, conscientes de que os cristãos se assemelham a uma pequena semente de mostarda, que tem a vocação e a força para se tornar uma árvore e dar muitos frutos.

As primeiras missionárias combonianas chegaram ao país em Março de 2012, convidadas pelo bispo de Kandy, José Vianney Fernando. Tinha-nos conhecido no Dubai, onde viu como funcionava a escola, o centro catequético e como acompanhávamos as diferentes comunidades de migrantes que ali estavam presentes. Como a paz se estava a estabelecer no Sri Lanca, após quase trinta anos de guerra civil [1983-2009], o bispo queria-nos na sua diocese. Qualquer ajuda era bem-vinda para fortalecer a educação e curar a convivência entre os Cingaleses e os Tâmiles, os dois grupos étnicos enfrentados.

As irmãs Libanos Ayele, Quy Thi Dinh e Nelly Kangogo foram as pioneiras. Começaram do zero na missão de Talawakelle, localizada no centro da ilha, uma missão que estava chamada a viver e a crescer num ambiente em que os cristãos eram minoritários. 

Cheguei a Talawakelle em Agosto de 2017. Actualmente, somos uma comunidade composta por quatro irmãs, cada uma de nacionalidade diferente, mas chamadas a testemunhar o Evangelho com a vida. 

Lembro-me do dia em que cheguei. Em vez das habituais quatro horas e meia, levámos seis horas para chegar à missão porque estava a chover torrencialmente. Três anos depois, cada vez que faço esta viagem, ainda sou surpreendida pela majestade da selva, pelas cores vivas dos templos hindus e pela serenidade impassível dos budas jacentes no meio da montanha. A Natureza e religiosidade desta cidade são o seu melhor cartão-de-visita. 

Jovem e inexperiente, aterrei cheia de paixão e ansiosa para revolucionar tudo o mais rápido possível. Agora ainda sou jovem, mas o tempo e as pessoas ensinaram-me que, além da paixão, a missão requer paciência, perseverança, oração e muita humildade; liberdade de conhecer, colaborar, amar e deixar amar pelas pessoas que nos recebem. As pessoas com quem vivemos são pessoas que sofrem. Descendem dos escravos trazidos pelos Britânicos no século xix para trabalhar em plantações de chá, um dos produtos em que, ainda hoje, se baseia a economia do país. Devido às suas raízes indianas, muitos só adquiriram a nacionalidade cingalesa depois de 2003. Todavia, apesar do reconhecimento jurídico, os Tâmiles da região central do país continuam a ser uma das comunidades que é vítima de discriminação e sofre com as desigualdades económicas, políticas e sociais. Nesta região, a maioria da população depende da indústria do chá, seja na recolha ou no processamento. Atrás de cada

taça de chá, tão apreciada no mundo ocidental, estão as vidas de milhares de mulheres queimadas pelo sol e anémicas por causa das sanguessugas das plantações. Este é, infelizmente, o resultado da ganância de um sistema que troca 12 quilos de folha de chá por três euros, na melhor das hipóteses. 

Comunidades vivas

Com os olhos bem abertos a esta realidade, em que a vida é explorada, especialmente a das mulheres, a nossa missão acontece. Partilhamos a alegria de trabalhar numa escola diocesana onde cristãos e hindus – estudantes e professores – nos comprometemos de alma e coração na formação de boas pessoas e cidadãos honestos. A educação é a ferramenta mais poderosa para quebrar o círculo da pobreza e o estigma da escravatura. Além disso, é o lugar propício para descobrir que as diferenças étnicas e religiosas não são uma ameaça, mas um reflexo da riqueza e da pluralidade do país. 

O outro pilar da nossa presença é a paróquia de St. Patrick’s, com mais de 1500 famílias cristãs espalhadas por 60 comunidades. Há muitas vidas e muita vida: mais de 300 crianças na catequese, a Legião de Maria, os grupos da Divina Misericórdia e de São José Vaz, outros grupos de jovens. É uma tarefa que partilhamos com os dois sacerdotes diocesanos da paróquia, os padres Mathew e Dilan, e com as irmãs da Sagrada Família de Bordéus. Somos uma comunidade cristã que se parece a uma semente de mostarda. Apesar de ser a menor das presenças religiosas do país, tem a vocação e a força para se tornar uma árvore capaz de fornecer abrigo e dar bons frutos.

Agradeço a Deus e a este povo pelos anos partilhados. A oração constante de budistas, hindus, muçulmanos e cristãos fortaleceu a minha própria oração. A prioridade da família na sociedade cingalesa fez-me valorizar ainda mais a minha. A simplicidade e a pobreza com que vivem os meus vizinhos levou-me a tentar encontrar o que é verdadeiramente necessário. A solenidade de algumas celebrações, os simbolismos, as cores e os cheiros fizeram-me entender que nada é demasiado belo para Deus. A alegria serena, a timidez que rapidamente se torna confiança e a conversa com mil perguntas ensinaram-me a valorizar a importância de deter-se e conversar com as pessoas. O sofrimento destas pessoas que foram escravizadas reforça a promessa de Cristo: «Vim para que tenham vida e vida em abundância.» A fé inabalável de uma minoria, por vezes perseguida e massacrada, confirma que a Igreja é uma mãe, que está chamada a sair dos templos e das barreiras do medo e do privilégio; que ainda quando é perseguida está chamada a ser anúncio da vida plena em Jesus Cristo.  

Revista Além-Mar, Outubro 2020