Notícias do Sudão do Sul.
Caros amigos e amigas, escrevo-lhes com mais notícias do Sudão do Sul.
Primeiramente quero agradecer a todas as pessoas que se fazem solidárias conosco e com milhares de irmãos e irmãs que sofrem com a guerra no Sudão Sul, sobretudo com suas orações. Como sabem, três missionários combonianos e uma irmã comboniana foram evacuados da missão de Leer no dia 9 de maio. Eles estão bem na capital Juba. O próprio povo da missão, ao sentir o perigo se aproximar, aconselhou os missionários a partirem para que nada de mal lhes acontecessem e assim possam um dia retornar à missão quando terminar a guerra.
As informações de que forças leais ao governo estariam se aproximando de Leer de fato se confirmaram. No sábado dia 16 Leer foi mais uma vez saqueada, ou pelo menos o que por lá havia. O mesmo aconteceu com a missão (igreja e residência dos missionários). Na verdade não havia por lá muitas coisas desde o primeiro grande saque em janeiro e fevereiro de 2014. No domingo dia 17 as forças do governo chegaram a Leer. A população, porém, já havia-se refugiado nos povoados e outros lugares mais distantes.
Leer é uma cidade fantasma. De acordo com a ONU e Cruz Vermelha cerca de 100 mil pessoas estão refugiadas em lugares inospitáveis e em condições bastante precárias. Em breve faltará alimentos e remédios. Vivi essa situação com meus colegas missionários e com o povo de Leer por 18 dias no ano passado e sei o quanto é difícil estar refugiado no mato com medo de ataques, com pouca comida e sem água potável.
Dados da ONU estimam que as pessoas deslocadas pela guerra passam de 1.500 milhões. As pessoas que se refugiaram em países vizinhos ultrapassam 540 mil. Não se sabe ao certo quantas pessoas foram mortas nos últimos 16 meses de conflitos. Acredita-se que passam de 30 mil mortos. Tanto o governo (exército) quanto a oposição (rebeldes) são responsáveis e ambos continuamente violam o acordo de cessar fogo assinado em maio de 2014.
A população de Leer e de toda a zona dos conflitos é composta na sua maioria por idosos, mulheres e crianças. Os jovens e homens adultos estão na linha de frente dos conflitos e milhares já morreram. Há informações de constantes ataques à população civil, mulheres sendo violentadas, povoados incendiados e recrutamento de menores para a guerra.
Por mais quantas vezes o povo vai ter que se deslocar e se refugiar no mato e bases da ONU com medo antes que essa guerra estúpida termine? Quantas mais pessoas inocentes ainda terão que morrer antes que a comunidade internacional faça as lideranças políticas egoístas e fratricidas desse jovem país sofredor assinarem um acordo de paz? Não só Leer, mas a Diocese de Malakal inteira (três estados na zona de guerra) está sofrendo há uma ano e meio desde que começaram os conflitos em dezembro de 2013.
Quanto aos missionários, informo-lhes que dois que estão em Ayod (Mokok) e dois que estão em Old Fangak estão bem, apesar das dificuldades. Há uma missionária comboniana entre os deslocados de guerra em Malakal. Está segura na base da ONU. Há também um padre diocesano em Bentiu (base da ONU) e outro em Bor. Os demais missionários, religiosas e padres da diocese de Malakal tiveram que ser evacuados.
Quanto a nós que estamos em Juba, podemos dizer que estamos bem. Estamos fora da zona dos conflitos. Porém a crise financeira que afeta esse país em guerra civil fez com que faltasse combustível e e aumentasse o preço de tudo. O povo aqui sofre com a enorme carestia e insegurança. Ninguém diz que é proibido protestar, mas se alguém grita contra essa situação pode ser reprimido. Continuamos, no entanto, tentando ser sinal de vida e esperança para esse povo sofrido. Continuamos ao mesmo tempo pedindo ao Deus da vida que nos conceda o dom da paz e reconciliação e que haja justiça e unidade para os povos do Sudão do Sul.
Por favor continuem rezando por nós e conosco. Fiquem com a graça e o axé de Deus.
Pe. Raimundo Rocha, mccj – Juba
– 18 de maio de 2015 –